Um telefonema deveras arrepiante
Abril 20, 2020
Ricardo Correia
Esta quarentena pela qual estamos a passar, obrigou a mudança de rotinas lá em casa. Os miúdos estão isolados em casa a fazer cabelos brancos à mãe, que embarcou com eles neste episódio. Isto de ser mãe multi-tarefas é complicado. É mãe, professora, explicadora, animadora, desenhadora, pintadora, brincadora, cozinhadora, confinadora, ginásticadora, arrumadora e tantas outras coisas acabadas em dora.
Eu, infelizmente continuo a trabalhar. Afinal de contas alguém tem que ajudar a economia a ir para a frente! Claro, que quando regresso a casa vou sempre com o coração nas mãos, com medo de lavar algo indesejado comigo. Isto de uns estarem isolados e outros terem que continuar a andar por aí, faz-me uma confusão ao cérebro que ninguém imagina.
Estava eu a bolir afincadamente a ganhar calo no traseiro, confinado ao meu barraco de cinco metros quadrados, com duas secretárias, um computador e dois monitores, assim a modos que à patrão... mas sem o ser. E que mal a gente se consegue mexer lá dentro, quando sou surpreendido pelo toque do meu telemóvel. Lanço um olhar de relance para o visor que se iluminou com a receção da chamada e vislumbro o rosto da Cláudia no ecrã. Atendo normalmente. Contente com aquela voz que me fala, quando ela me elucida de que afinal está meramente a fazer o papel de telefonista e intermediária.
Cláudia - Olha. A tua filha mais nova quer falar contigo.
Hum! Franzo o sobrolho desconfiado com o que aí vem. Para a pirralha querer falar comigo não deve ser coisa boa!
Eu - Olá bebé! Estás bem? - Pergunto eu sem esperar uma resposta.
Ouço uma voz toda divertida do lado de lá.
Beatriz - Olá papá. Olha - Dispara logo ela sem me deixar falar mais nada - Quando voltar à escola vou casar com o "Nuarte"
Eu - Como é ?!
Beatriz - Sim... Olha ... o Nuarte vai ser meu marido!
Eu - Então... Mas Ainda nem perguntas-te ao rapaz se ele quer namorar contigo, quanto mais casar.
Beatriz - Ele quer. E vamos casar... Na escola.
Do outro lado dava para ouvir a mãe a rir à gargalhada, enquanto eu tinha um ligeiro enfarto do miocárdio. A minha barraca ficou completamente enevoada enquanto eu fumegava das orelhas.
A conversa morreu logo por ali porque ela despachou-me logo passando o telemóvel de volta à mãe.
Eu - Isto da quarentena está a deixar tudo maluco. Nem os putos se salvam...
Cláudia - Dava tudo para ter visto a tua cara naquele momento.
Eu - Mas o que é que lhe deu nessa cabeça?
Cláudia - Então ela anda aqui a brincar aos maridos. O ursão grande é o marido dela. Depois saiu-se com essa.
Então não resisti e disse-lhe que ela tinha de te contar isto. Ah! Foi tão engraçado...
Eu - Ok! Ao menos alguém que se divirta... - Disse entre dentes - Nem que seja com a minha fronha feia!